joel-peter-witkin an objective eye

Joel-Peter Witkin An Objective Eye

Originally posted 2015-02-04 00:11:50.

No último Photobook Club Lisboa, tive o prazer de apresentar o trabalho de Joel-Peter Witkin, fotógrafo de referência para mim e o meu próprio trabalho “Take My Body”.  Recentemente tive também o prazer de descobrir o último documentário produzido sobre aquele fotógrafo. É um filme de distribuição online e custa apenas 11.04€. Fica aqui o link para quem o quiser adquirir e ficar a conhecer o conceito por detrás de muitas das suas fotografias, conhecer melhor este génio da fotografia e histórias pitorescas resultantes da sua atividade como fotógrafo. Aqui está o link:  
Entretanto fica o trailer!

Quando começaram os fios a ser de vida?

Originally posted 2007-06-23 17:00:17.

Joel Peter WitkinDepois de concluída a minha formação académica na área da estética fotográfica e influenciado por fotógrafos como Joel-Peter Witkin (imagem ao lado) e Peter Dazeley, no que ao grafismo e arrojo das suas imagens concerne, dispus-me a arriscar um trabalho diferente daqueles que era usual ver. Isso não significava que alguém não tivesse já feito, e bem, queria apenas saber se era capaz de o fazer, sem receio do desastre que podiam ser os resultados finais. Meti-me no estúdio e fiz tudo o que era possível, considerando os resultados pretendidos, para quebrar as regras que durante o Curso Profissional de Fotografia, havia aprendido, sem nunca esquecer as palavras dos que me ensinaram e que sintetizarei neste aforismo: “Para quebrar regras é necessário conhecê-las!” Conhecia-as, ainda não as esquecera e pouco as havia porventura posto em prática e pensei: “Vou fazer (quase) tudo ao contrário!” As luzes usadas foram apenas as de modelação e a profundidade de campo foi a menor possível, para que os modelos fossem irreconhecíveis. Usei filme a preto e branco e depois de digitalizado diverti-me a assassinar as imagens, criando molduras, imitando os riscos de um filme já pouco saudável. O trabalho final agradou-me. A experiência não tinha sido má de todo, a meu ver, claro.
Terminado e apresentado o projecto que chamei de “Miopia”, por razões óbvias Miopia_Arlindo_Pinto_Fotografia(imagem abaixo), decidi que  tinha que haver algo mais do que “miopia”. Porventura cegueira completa… Fui pensar no assunto de máquina entre mãos para um local movimentado da capital. Pensei mais uma vez na técnica fotográfica e nas possibilidades que ela abria quando as regras são quebradas. Para mim a câmara fotográfica está para a fotografia como o pincel está para a pintura. Instrumentos de desenho que não se limitam a captar o real, mas também a outra faceta desse real que, na tela ou no papel fotográfico ou outro suporte, pode revelar algo que o olho humano, por si só, é incapaz de vislumbrar. As imagens de Peter Witkin estavam sempre presentes. E as de Peter Dazeley também (imagem abaixo).

peter-dazeley.jpgPois que é isso da máquina fotográfica senão um instrumento ao serviço da arte, um instrumento capaz de mostrar um real que quase ninguém vê, mas que nos acompanha 24 horas por dia, em qualquer lugar onde estejamos? E porque não aliar isso à falta de espaço físico identificável? Para quê mostrar algo que à imagem não traz qualquer valor? Deixemos apenas a vida fluir num espaço etéreo, onde só ela importa. Mostremos as cores e os movimentos dos que as usam, dos que lhe dão vida.
Com pensamentos desta natureza em mente, preparei-me para violar as regras, para afrontar os puristas e comecei a disparar e captar tudo o que se movia desde que fosse colorido. Tinha dado início aos “Fios de Vida”. As pessoas começavam a aparecer nas imagens como um mais ou menos estreito fio, um fio repleto de vivências, alegrias e tristezas, enfim um fio de vida. Adorei desde logo a primeiríssima imagem que vi no pequeno ecrã da minha câmara (imagem abaixo).
Estava ganha a tarde de reflexão. Os trabalhos expostos na exposição que decorre, foram sendo fotografados por aí, a sua maioria em Lisboa e um deles em Roma. Para os fãs da “freira azul” de Roma, quero dizer que ela ficou de fora mais uma vez porque… sim!
Desejo deixar aqui um público e reconhecido agradecimento àqueles que foram meus professores, dois dos quais me deram a honra de estarem presentes no dia da inauguração da exposição, o Mário Pires, mestre em estética e o Curado Matos, mestre no preto e branco e mais. Apesar de não poder estar presente, um agradecimento especial ao Ricardo Dias, um professor e também um amigo. Ainda agradecimentos ao Luís Índias e “last but not least”, ao Carlos Marques, mestre de um sem número de fotógrafos portugueses, que passaram e continuam a passar pela “Oficina da Imagem” e meu mestre também.
Um agradecimento final a todos os que passarem pelo Centro de Arte Comtemporânea para ver os trabalhos ali patentes, de que imodestamente me orgulho, quer gostem, quer detestem. O importante na arte é provocar emoções, sejam elas de prazer ou de desagrado. Se assim for, o produto do trabalho do “artista” será notado e isso é que importa.

O primeiro vislumbre

Originally posted 2018-08-27 17:54:32.

Frequentar aquele bar tinha-se tornado um hábito incontroverso. Era já como se os pés, àquela hora, terminada a jornada de trabalho, para ali se dirigissem sem que se tornasse necessária qualquer ordem consciente oriunda do seu cérebro. Salvo em dias de horas extraordinárias, em que o director, reverenciando a administração, lhe pedia para finalizar um pedido “inadiável e essencial” para a manutenção em funcionamento da empresa, era ali que terminava os dias, antes de se dirigir ao apartamento que mantinha alugado e parcamente mobilado “para os lados do Martim Moniz”. Era desta forma que respondia aos seus já sobejamente conhecidos empregados do bar que frequentava, quando questionado sobre a sua morada, por entre uma conversa de circunstância, já que o seu ar circunspecto não permitia muitos avanços ou intimidades a terceiros. Ao certo ninguém sabia o que lhe ia na cabeça. Estou em crer que nem ele próprio sabia muito bem!
Àquela hora pedia o seu “bourbon sem gelo”, chovesse ou fizesse sol. As condições atmosféricas nunca interferiram com os seus hábitos alimentares, sobretudo no que toca à bebida. Despedia-se, invariavelmente, depois do terceiro, com um seguro “até amanhã”!
Naquele dia sentia que algo de diferente estaria para acontecer. Estava ansioso por chegar ao seu bar favorito. Ora se sentava ora se levantava. Quando sentado remexia-se na cadeira, coçava-se como se tivesse apanhado sarna. Fartara-se já da sua jornada. Naquele dia a rotina não lhe caiu bem.
Estava farto de ali de estar, de forma que à hora exacta, 17h30m, fez o seu registo pontométrico, saiu finalmente da empresa e só sossegou quando o seu bourbon lhe foi servido, no seu covil preferido.
Conhecia largamente os que por aquela hora ali costumavam parar. Matutava sobre a vida que cada um levaria, o que os fazia avançar, ir em frente, não desesperar da monotonia que as suas vidas haviam de ser. Nunca chegava a conclusão alguma. Também nunca interpelou ninguém para o questionar sobre o assunto, para o confrontar com a possível sonolência do seu ser, da mesquinhez dos seus objectivos. Todos lhe pareciam gente sem outro rumo que não fosse o de ali estar, porque um dia alguém os pariu e lhes disse: “Estais vivos, agora desenrascai-vos!” Mas seria ele diferente?
Talvez sim, talvez não! Mas pelo menos ele pensava no assunto, caramba. Sim podia viver uma vidinha de trazer por casa, mas tinha consciência disso. Era lúcido, mas solitário, mais por opção do que por constrangimento. A sua vida social resumia-se a uns quantos jantares em casa do exíguo círculo de amigos que mantinha.
Foi afogando a sua ansiedade nos sucessivos goles de “bourbon” que suavemente lhe acariciavam a garganta. Olhou de relance em redor e tudo lhe pareceu igual a tantos outros dias: os mesmos semblantes carregados, o odor a café, a suave brisa que entrava pela porta entreaberta… Nada de novo, pensou! A que propósito tantas ânsias, questionou-se.
Estava já no seu terceiro, quando o sol no declínio, fez exagerar no chão do “Moinho de Café”, o comprimento de umas elegantes pernas femininas, que nas extremidades se faziam acompanhar de uns sapatos pretos de salto alto, por certo italianos.
Peres pousou o copo meio de bourbon e deixou cair ligeiramente o queixo, entreabrindo a boca o suficiente para mostrar a língua curtida pelo álcool.
Há cinco anos que vivia na Capital. Veio do interior, de uma sucursal, para a sede da empresa, com ordens para “colocar na linha aquele pessoal” e durante todo o tempo em que frequenta o “Moinho”, nunca por ali viu pernas iguais àquelas. Caramba, nem estava em si e ainda não tinha visto da mulher sequer metade.

Foto de Joel Peter Witkin