Escrava da Noite

Originally posted 2015-02-04 00:14:59.

Xeque Mate - Escrava da NoiteSou agnóstico. Acredito que não sabemos nem poderemos nunca saber se existe um Deus. Já houve quem me quisesse dissuadir deste céptico agnosticismo, mas sem sucesso: e que sim, que Deus existe e é grande. Senão como surgiu este universo multifacetado e repleto de contradições?
Está bem! Foi Deus que criou o mundo que conhecemos. Mas, quem criou Deus? Eu tendo a achar que foi o Homem! E que cada vez que oramos, os que o fazem, ajoelhados junto de um leito que um dia há-de ser de morte, qual criança pedindo ao Senhor que os monstros abandonem a escuridão do quarto, em rigor, rezamos ao Homem, solicitando para nós e para terceiros muito do que nós próprios podemos dar. Dádivas que a preguiça e descrença no próprio Homem obstaculizam. Mas, se o Homem Criou Deus, então, por entreposta pessoa, o Homem criou o mundo.
Por este e outros motivos que não vêm ao caso, evito persignar-me ou benzer-me invocando a Santíssima Trindade. Isso seria desonesto e hipócrita.
Prefiro invocar a única trindade que me concede alguma serenidade. Para lá da cervejaria propriamente dita, a invocada por um dos grupos “one hit wonder” esquecidos do “boom” do chamado “rock português”.
É bom que se diga desde já que, à semelhança da morte, como cantou o José Mário Branco, o “rock português” nunca existiu. Assim como não existe rock chinês, brasileiro, espanhol, sueco, inglês ou até americano. Existe o rock, como abreviatura do rock’n’roll e é afro-americano. Ponto final parágrafo.
Regressando ao tema do monólogo, a única santíssima trindade que invoco é a que dá título ao álbum dos Xeque-Mate, pais do mítico “Vampiro da Uva”, que aqui recordamos: “Em nome do pai, do filho e do rock’n’roll”.
Remexendo as minhas memórias consigo visualizar o pai e o filho e o destino de cada um. O pai está morto, o filho vive, mas a questão é: por quanto tempo? O rock’n’roll é eterno! O pai do rock era coveiro, já aqui o dissemos e prometemos falar dele mais tarde. E falaremos, mas não hoje. A bebida deu-lhe um bilhete de ida até ao outro lado. O Rock, por outro lado, curtido pela bebida, hábito herdado, por certo, é cada vez menos avistado nas redondezas. Refugia-se na casa na qual em noite de bebedeira, para lá da rápida degustação do vinho que corria farto e carregado da pipa, comemos cebolas cruas para acompanhar. A fome pode determinar comportamentos estranhos. A bebida também.
Não sei o que é feito dos Xeque-Mate, mas tenho respeito pelos rapazes. Pelo esforço, pela dedicação, não tanto pela glória, que foi efémera. Por mero acaso veio parar-me às mãos, comprado no último “Stockmarket”, um exemplar da pouco santíssima trindade acima referida. Não resisti a deixar aqui um cheirinho do vinil com a “Escrava da Noite”, uma ode às prostitutas coitadas!
– Coitada, tem que dar o corpo ao manifesto para sobreviver.
Diria eu que, pelo menos, estas são mais honestas do que aquelas que o dão por outra ordem de razões. Estas são ordinárias!
E são escravas de quê?

4 thoughts on “Escrava da Noite

  1. Quanto às ordinárias que não são prostitutas:
    “Quando voçê elimina o impossível, o que sobra por mais incrível que pareça, só pode ser a verdade.”
    Conan Doyle

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