Cocktail de dôr.

Originally posted 2018-04-27 06:04:46.

dorHowdy!
A vida de um homem dá voltas como tudo! Tantas e tantas que por vezes até um tipo fica meio zonzo. Tenho estado ausente daqui precisamente por razões dessa natureza: ando zonzo. Vamos supor que eu não entendo nada de boxe, apesar de gostar de ver e que, por maldades praticadas no meu supostamente “negro” passado, alguém decidiu que tinha que ser severamente castigado e me lançou para dentro do ring onde Mike Tyson me esperava de olhos esbugalhados entrebatendo furiosamente os punhos, olhos raiados de sangue vivo e sem protecção dental. Medo! Preparava eu o lombo peludo para uma carga de pancadaria das antigas, quando me apercebi que não estava ali para ser massacrado fisicamente, mas “apenas” emocionalmente. Mike Tyson, depois de ter abandonado o boxe, foi preparado por um colégio de sábios norte-americanos no sentido de infligir castigos emocionais a indivíduos escolhidos de entre aqueles que tinham alguma vez na vida dito as palavras “foda-se” e “caralho” em frente das respectivas esposas e que agora já não eram amados pelas ditas, fartas de tanto alho, folhas e azeitonas. Mais aterrado fiquei! Por vezes eu era um”alhista” militante. Alho p’rá aqui alho p´rá ali, furioso, gritando bem alto. Depressa me apercebi que a minha vida iria acabar ali mesmo no tapete azul com publicidade àquela cerveja dos padres, missionários ou lá que o que quer que sejam. Os portentosos golpes iniciaram-se e mais pareciam mísseis emocionais teleguiados. Directos e upercuts, ganchos e jabs de esquerda. Curiosamente os golpes tinham efeito semelhante aos castigos físicos e eu sangrava já da boca qual porco na matança. E porque foste assim e assado e fizeste isto e aquilo e a malta não gostou, toma lá mais um upercut.
Sem reacção e forças suficientes para aguentar sóbrio a carga, larguei o corpo e a mente ao sabor dos sopapos e desfaleci. Quando vim a mim, tinha uma adaga cravada nas costas e interroguei-me:
– Se tenho esta adaga enterradas nas costas e a lâmina me atravessa o coração, porque é que não estou morto?
De bruços no chão do ring, apercebi-me de que a garrafa da cerveja medieval estava cheia do sangue que me jorrava dos ouvidos e da ferida aberta pela adaga. Gritei bem alto:
– Alguém me explique o que se passa aqui!
Nada. O Mike Tyson nem vê-lo. Repeti o apelo. Apenas ouvi o zumbido dos mosquitos que se alimentavam do meu sangue, quais vampiros em repasto. Por uma brecha na grossa parede de granito tosco, chegava uma luz branca. Viria da rua? Teria eu cura, apesar do meu estado lastimável? Os ovnis existem mesmo? E o homem de Neandertal masturbava-se? Tudo interrogações para as quais não tinha resposta, nem ninguém por perto disposto a fornecê-las.
A cabeça pesava-me e estava eminente o meu sono eterno.
A luz na parede tornou-se mais intensa e à frente dos meus olhos incrédulos formou-se um halograma. Era constituído por uma esbelta louraça nua, de seios hirtos e nádegas espetadas. Naquele momento sabia que seria para mim difícil ter uma erecção, por isso nem tentei concentrar-me no assunto e revoltado pensei: “agora é que apareces, depois do mundo me ter desabado em cima, puta!” A dita, que me leu o pensamento, não se fez rogada e atingiu-me com um raio multicolor, que descarregou em mim uns quantos vóltios de electricidade. O corpo dorido estremeceu e fiquei para ali fumegando. A loura telepaticamente aconselhou-me a ter mais cuidado com a língua. Nem me atrevi a pensar desta vez.
Finalmente, depois da poeira assente, perguntei:
– Quem és tu?
A resposta não tardou e desta vez de viva voz:
– Sou o anjo enviado para te levantar desse chão em que jazes imerso no teu próprio sangue.
– Hã? Não brinques comigo, nem sequer sou católico!
– Não fales. Só pioras o teu estado. Levanta-te e dirige-te para a luz que jorra da parede. Lá encontrarás uma oportunidade de cura, de recomeçar. Usa o que sabes e o mundo pode ser teu!
Fiquei aparvalhado com o discurso da senhora, mas o facto é que me consegui levantar e obedecer, mais por medo do que com esperança. Ao entrar na luz as chagas foram progressivamente desaparecendo e comecei a sentir-me melhor. Ao longe ainda tive tempo de ouvi-la dizer:
– Algumas demorarão a sarar. Sê paciente, tu pertences àqueles a quem os deuses adoram ver crescer novos.
Que raio queria aquilo dizer?

5 thoughts on “Cocktail de dôr.

  1. Interpretações p/ o enigma lançado pelo halograma/puta/anjo:
    Hipótese A – “Glória aos que caem”;
    Hipótese B – Quem disse que todos os mares secaram?

    Deixe ir a B, deixe ir a B…como no concurso…

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